RFID está em franca expansão no mundo todo

Com a redução dos custos dos equipamentos e tags, o aumento do desempenho dos leitores e os padrões internacionais da GS1, houve uma aceleração das implantações da tecnologia nos últimos anos

Odarci Maia Jr

Nos últimos cinquenta anos a indústria e o comércio tem utilizado o código de barras para automatizar os seus processos de identificação e captura automática de dados, bem como para a identificação de mercadorias e materiais. O início do uso intensivo do código de barras no comércio em geral, aliado a uma padronização de códigos de identificação nos anos 1970, permitiu a rápida disponibilização de informações sobre as vendas, até então coletadas e registradas de forma lenta por meio de processos manuais.

O uso do código de barras também permitiu vantagens adicionais, tais como o aprimoramento do controle de vendas, a facilidade no processo de atendimento de clientes e um melhor controle de estoques. O controle adequado do custo de estoque das empresas permite reduzir os seus custos operacionais e tem impacto direto nas margens e no lucro líquido do negócio.

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Odarci Maia Jr.

Mesmo com a evolução dos códigos para as potentes versões 2D tais como o QR Code e o Datamatrix, que permitem a codificação de grandes quantidades de dados, os códigos de barras sempre apresentaram algumas limitações de difícil solução, desde a sua introdução. A primeira é o seu processo de leitura que necessita ser realizado de forma individual e com o código na linha de visada do leitor (scanner). Esta exigência implica na necessidade de maior tempo para a execução de processos.

Um exemplo clássico é a fila no caixa de supermercados onde a identificação dos itens é feita de forma individual, acarretando longos tempos até que se conclua a totalização das mercadorias e os procedimentos de pagamento possam ser finalizados. O fato de existir a necessidade da efetiva visualização do código de barras implica na abertura de embalagens intermediárias e a separação e posterior orientação dos itens a serem lidos, o que mais uma vez implica em tempos adicionais ao processo.

Tal limitação, por exemplo, inviabiliza a execução de inventários de estoque com maior frequência. Uma consequência imediata é a possibilidade de perda de vendas, principalmente no comércio eletrônico, uma vez que o lojista não tem certeza se determinado item está ou não disponível no seu estoque.

Outra limitação do código de barras é o fato de os dados codificados permanecem fixos, ou seja, uma vez que ele seja impresso não há a possibilidade de atualização ou acréscimo de informações. Para estas situações faz-se necessária a geração e impressão de um novo código de barras que deverá ser afixado ao item em substituição ao código de barras anterior. Desta forma, são demandadas novas etiquetas, uma impressora para a produção do novo identificador e de alguém para executar esta tarefa.

Imagine uma forma de acelerar exponencialmente este processo de leitura de dados, com a consequente redução de tempos de execução de processos e, consequentemente, dos custos associados.

Graças aos recentes avanços na tecnologia de semicondutores, processadores digitais e de protocolos de comunicação de dados, a identificação por radiofrequência (RFID – Radio Frequency Identification) surge de forma viável no mercado como uma solução para agilizar o processo de captura automatizada de dados, apresentando vantagens adicionais em relação ao código de barras.

A comunicação de dados com RFID é realizada com a participação de dois componentes. De um lado dispositivos simples, chamados de tags ou etiquetas RFID, e do outro lado um equipamento leitor, composto por um rádio transceptor acoplado a um sistema de processamento de dados. As etiquetas normalmente são pequenas, de baixo custo e dispensam o uso de baterias, podendo ser facilmente afixadas aos produtos ou materiais a serem identificados, o que pode ser feito de forma automatizada. Existem, ainda, etiquetas para algumas aplicações específicas que fazem uso de baterias. São as chamadas etiquetas RFID ativas e semipassivas.

A tecnologia RFID tem sua origem na história do século XX. A primeira aplicação conhecida do conceito RFID surge em meados da década de 1930, pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial, com a invenção do radar. Havia a necessidade de identificar se uma aeronave que se aproximava era pertencente ao inimigo, num provável movimento de ataque, ou se era amiga, apenas retornando para casa.

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RFID está em franca expansão no mundo todo

Neste período os pilotos militares alemães descobriram que ao executarem determinadas manobras com as asas de seus aviões os sinais de radar refletidos chegavam à equipe de monitoramento em terra com uma espécie de assinatura de sinal, permitindo distinguir, dentre os diversos aviões detectados, quais eram alemães e quais eram de esquadrilhas inimigas. Surge assim a primeira aplicação do tipo passiva para a identificação de um objeto por meio de sinais de rádio.

Nesta mesma época os ingleses desenvolveram, de forma independente, outro sistema com a mesma finalidade. Eles instalaram em suas aeronaves militares um transmissor de rádio que começava a emitir sinais específicos quando detectava a chegada de sinais de radar oriundos de bases aéreas inglesas. Tal sistema ficou conhecido pela sigla “IFF” do inglês “Identify Friend or Foe”, que em português seria algo como “Identificar Amigo ou Inimigo”. O desenvolvimento segue o conceito básico do RFID quando o sistema, ao receber determinado tipo de sinal de rádio, envia uma resposta com a sua identificação.

Em 1948 o norte-americano Harry Stockman publicou na revista Proceedings of the IRE (IEEE) o artigo “Communication by Means of Reflected Power” (em português “Comunicação através de energia refletida”), o qual é considerado como a publicação técnica pioneira detalhando o conceito da identificação por radiofrequência.

Com o desenrolar da chamada Guerra Fria, notadamente entre as décadas de 1950 e 1970, foram realizados enormes investimentos para o aperfeiçoamento da tecnologia do radar e dos transmissores de rádio, notadamente nos Estados Unidos e na Europa. Diversos trabalhos científicos foram publicados com contribuições sobre como um sinal na faixa de rádio poderia ser utilizado na detecção e identificação de objetos à distância. Nesta época os sistemas de RFID ainda estavam restritos ao ambiente militar ou em aplicações de espionagem.

Foi somente em 1970 que surge a primeira patente, registrada por Mario W. Cardullo nos Estados Unidos, descrevendo uma tag RFID ativa como memória gravável. Cardullo havia publicado no ano anterior um plano de negócios para investidores onde vislumbrava as possíveis aplicações da tecnologia nos setores de transporte, financeiro e médico. Dentre as possíveis aplicações, ele listou a possibilidade da identificação automática de veículos, sistemas de pedágio, meios de pagamento e sistemas para a identificação de pacientes em hospitais.

As evoluções tecnológicas nas décadas de 1980 e 1990, com a introdução de microprocessadores e memórias de alto desempenho com grande escala de miniaturização, permitiram a fabricação de sistemas RFID cada vez mais sofisticados e com menores custos. No final de 1990 foi atingida, nos Estados Unidos, a marca de um milhão de tags, a maioria empregadas no segmento automotivo.

Neste período começa a surgir a necessidade do estabelecimento de padrões técnicos, visto que os diversos fabricantes de tags e leitores RFID faziam uso de protocolos proprietários, inviabilizando a interoperabilidade de sistemas, tags e equipamentos, tal como ocorreu com os sistemas de código de barras na década de 1970.

Os primeiros avanços na padronização foram dados por um centro de pesquisas chamado de Auto-ID, criado em 1999 pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) e financiado por uma centena de empresas usuárias, além do Departamento de Defesa dos Estados Unidos e os principais fabricantes de tags e equipamentos RFID.

O trabalho colaborativo de diversos especialistas, baseados em inúmeros países de todos os continentes,  levou à criação, em 2003, da primeira versão do padrão EPC Global, que consiste num conjunto de soluções abertas baseadas numa etiqueta RFID passiva, bem como especificações técnicas detalhadas para os Esquemas de Numeração EPC (Electronic Product Code, ou no português Código Eletrônico de Produto), os protocolos de comunicação por rádio entre as tags e os leitores, além da especificação dos componentes físicos tais como as próprias etiquetas (tags) e os leitores.

Atualmente os padrões técnicos RFID são mantidos e continuamente aperfeiçoados de forma colaborativa pela GS1, aqui no Brasil também conhecida como Associação Brasileira de Automação. Tendo em vista que a comunicação entre as tags RFID e os leitores, que podem ser fixos ou portáteis, ocorre por meio de sinais de rádio destaca-se, dentre as vantagens em relação ao código de barras, a possibilidade de leitura sem o contato visual com o objeto, evitando-se a necessidade da manipulação e posicionamento deles, o que também eleva a própria segurança do processo.

Os objetos a serem inventariados podem até estar acondicionados dentro de embalagens secundárias ou dispositivos para transporte. Como cada leitura de dados por RFID demora apenas alguns milissegundos é possível a leitura de centenas ou mesmo milhares de itens em alguns poucos segundos, o que favorece a produtividade dos processos e os custos operacionais. Estima-se que o processo de leitura por meio de RFID possa ser cerca de quinze vez mais rápido que o realizado manualmente por meio da leitura óptica de códigos de barras.

Atualmente os custos reduzidos dos equipamentos e das tags, a significativa melhora no desempenho de leitura e a existência de padrões internacionais levaram à rápida adoção da tecnologia RFID nos mais diversos setores da sociedade, tais como a automotiva, farmacêutica, logística, postal, transporte, comércio, dentre outros.

Odarci Maia Jr é assessor dos Correios do Brasil, onde atuou na implantação do piloto postal internacional de RFID, capitaneado pela Universal Postal Union (UPU)

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